segunda-feira, 29 de outubro de 2012

AS 4 REALIDADES DA NOTÍCIA


James Nachtwey, fotógrafo de guerra em ação (ClicRBS.com.br)

O jornalismo não é neutro. Quando se trata de crítica de mídia, influências sempre lembradas são a formação do repórter, os interesses econômicos da empresa de comunicação, dos anunciantes. Mas é ingenuidade achar que só o viés ideológico determina o produto final - a notícia. Fatores administrativos (gestão, recursos humanos) e culturais também pesam sobre a produção de notícias. Considerando a notícia como uma tentativa de narrar a realidade, tentaremos mostrar quatro dimensões dessa realidade representada, de acordo com diferentes fatores de pressão.

A REALIDADE RECONSTRUÍDA
Aqui temos o fator técnico-administrativo. O telejornal, por exemplo, tem o vídeo gravado como base. Esse registro do real é determinado pelo tipo de câmera, se a mídia é rádio ou revista. Outros fatores que influenciam como o jornalismo reconstruirá a realidade são um deadline (prazo final para que o repórter entregue seu material) mais longo, um banco de dados próprio. Muitos jornais usam os serviços de agências de notícias. Assim, as notícias são redigidas por profissionais, quem sabe, estrangeiros, com uma visão de mundo completamente diferente de seu leitor final; e são reescritas por alguém que não estava no local em que o fato aconteceu.

A REALIDADE FRAGMENTADA
Os jornais possuem editorias (seções) para cada tema: ciência, economia, cultura. Essa divisão temática, uma necessidade operacional da empresa, pode dar a impressão de que os fatos são desconectados entre si. A fragmentação do real é acentuada pela velocidade do jornalismo – o jornal de hoje vira papel de embrulho amanhã. O maior exemplo da realidade fragmentada é o tema Meio-ambiente. O noticiário ecológico habitual se resume a cobertura de congressos, desastres ambientais, turismo ecológico. Temas correlatos ao meio-ambiente são tratados em outras editorias: Saneamento urbano na seção de política, sustentabilidade na seção de negócios.

A REALIDADE QUE INTERESSA
Alguns grupos de mídia são verdadeiros impérios. A AOL-Time-Warner inclui revistas, televisão, cinema, internet, gravadora. Outras corporações possuem times de futebol, fazendas, parques de diversão. É difícil, nessas empresas que movimentam bilhões de dólares, equilibrar lucro e ética jornalística. Quando políticos são donos de jornais, também há o risco de notícia e realidade serem divergentes. No Brasil, a pesquisa Donos da Mídia mapeou a intensa ligação de políticos com a mídia. Os anunciantes também exercem pressão gigantesca sobre o que é abordado ou excluído do jornal. O noticiário sobre trânsito, ecologia e prática de esportes com certeza teria outra abordagem se, por exemplo, o telejornal não precisasse das verbas publicitárias das fábricas de automóveis.

A REALIDADE ESPETACULARIZADA
O jornalismo policial é um exemplo claro. Alguns telejornais policiais tem efeitos sonoros e visuais que mais parecem um filme – uma ficção, e não a realidade. No noticiário político, explora-se a briga entre rivais, as alianças, as denúncias, as novidades jurídicas – como uma novela. Pouco sabemos do teor das leis, das pesquisas feitas para criá-las, dos interesses econômicos envolvidos, do seu impacto em nossas vidas. A recente guerra do Kosovo e o manifesto do estudantes da USP contra a presença de policiais na universidade são fatos diferentes que se tornam uma mesma pancadaria sem sentido quando a realidade é espetacularizada. A prioridade é o espetáculo - ainda que grotesco, não o fato.

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